domingo, 7 de abril de 2013

Beata Maria Assunta Pallotta, religiosa


    

     Primogênita de Luís Pallotta e Eufrásia Casali, agricultores pobres, que tinham de trabalhar com afinco de manhã à noite para sobreviver, Maria, aos oito anos, teve de abandonar a escola, que freqüentava desde os seis, para ajudar a mãe nas lides de casa e tomar conta dos irmãozinhos, Alexandre, José, Vicente e Madalena.
      Mas nem assim a família conseguia o necessário para a vida. Era forçoso arranjar trabalho remunerado para a pequena Maria. Puseram-na, por isso, a servente de uns pedreiros, que trabalhavam nas redondezas. Estes encarregaram-na de transportar baldes de água e cestos de cal e cimento. A tudo ela se sujeitou de cara alegre e com tão boa disposição que logrou ser respeitada por aqueles homens. Na sua presença não se atreviam a proferir palavras inconvenientes.
       A mãe, no entanto, achou que aquele trabalho era demasiado pesado para a filha e conseguiu-lhe outro mais leve em casa de um velho alfaiate do lugar, que a recebeu com satisfação.
        Entrementes, a ação do Espírito Santo na alma da menina era cada vez mais notória. Desde os mais tenros anos sentia uma atração irresistível para a oração. Depois do trabalho em casa do alfaiate, corria à igreja a visitar o Santíssimo. Ai se demorava de olhos fitos no sacrário. A um canto da cozinha levantou um altarzinho. Depois de ter arrumado tudo, quando a família já dormia, ela, de joelhos diante das imagens do pequenino altar, rezava e meditava na vida dos santos.
        Esta vida de oração levava-a à prática da caridade, que se traduzia em ir buscar água à fonte e prestar outros serviços a famílias doentes ou pessoas de idade. Para aquilatar o valor destes atos, deve-se ter presente que o tempo mal lhe dava para o trabalho da alfaiataria e da própria casa. Era preciso não perder um minuto para dar conta de tudo.
      O pároco, conhecedor daquela alma de eleição, aos onze anos encarregou-a de ensinar, aos domingos, o catecismo às mais pequeninas. Com que satisfação ela aceitou o encargo é fácil imaginar.
         Assim ia Maria Assunta crescendo em idade e virtudes, guiada pelo Espírito Santo, que a preparava para a vida consagrada. A idéia da vocação surgiu-lhe de um incidente banal, no dia 2 de março de 1897, numa festa da aldeia. Ela abandonou a festa e no dia seguinte confiou a Marieta Fedeli, sua íntima amiga: "Se não formos para religiosas, não nos salvaremos! Não, não conseguirei salvar-me..."
         A resolução estava tomada. Mas havia dois problemas: ela era arrimo da casa e sendo a família muito pobre, ela não contaria com o dinheiro do dote. Porém, o que é impossível aos homens é possível ao Espírito Santo. Assunta sabia disso, e à força de oração e penitência haveria de lograr o seu intento.
         O Senhor, que recomendou: "Pedi e recebereis", dispôs as coisas de forma que a jovem pudesse entrar numa congregação. Serviu-Se para isso de um Bispo, dom Luís Canestrari, natural de Force, que vivia em Roma. Foi o prelado passar alguns dias à terra natal. Informado pelo pároco das prendas e desejos da menina, interessou-se por ela e conseguiu que a Superiora Geral das Franciscanas Missionárias de Maria generosamente a recebesse sem dote.
          Era o mês de Maio de 1898. Mês de flores e mês em que o trabalho do campo mais aperta. Seus pais e irmãozinhos atiraram-se a ela, suplicando-lhe: "Não vás, Assunta. Não te vás embora".
      "Quem lhe daria energia, coragem decisiva e inabalável, a ela, que era tão sentimental, tão afeiçoada aos seus entes queridos?... Mais tarde, lá na China, havia de escrever a seus pais: 'Só Deus seria capaz de me apartar de vós'" (F. M. M., O Caminho de Assunta, Barcelos, 1955, p. 37).
           Maria Assunta teve que apelar para toda a força do seu amor a Deus, a fim de não vacilar naquela hora. Partiu de casa com o coração a sangrar e entrou em Roma, na arca santa da vida consagrada, a entoar louvores à misericórdia do Pai Celeste.
          Da casa de Roma, na Via Giusti, onde fez a maior parte do postulantado, passou para Grottaferrata, a fim de se preparar para receber o hábito e dar início ao noviciado. Lá, como em Roma, a sua vida pode sintetizar-se nestas breves palavras: humildade profundíssima, obediência pronta, total e alegre, por mais pesados que fossem os trabalhos.
          De fato, em Grottaferrata, as religiosas para prover ao próprio sustento, cultivavam alguns campos e criavam frangos, pombos e suínos. Assunta, apesar estar habituada a trabalhos rudes, sentiu no corpo a carga que lhe impuseram na vida consagrada. Mas com o pensamento de "fazer tudo por Jesus", como repetia amiúde, não havia nada que lhe perturbasse a alegria, nem sequer a limpeza da pocilga em dias de chuva.
       Ademais, tinha sempre presentes as palavras da Fundadora da Congregação, Madre Maria da Paixão, que, ao vê-Ia a primeira vez em Grottaferrata lhe perguntou o nome e de onde era, e comentou:
        - "És das Marcas?! Olha que as Marcas são terra de Santos; e é preciso que tu também o sejas" (o. c., p. 74).
         Sê-lo-á e bem depressa, como veremos. Mas antes terá que passar pelas provações a que Deus submete os seus fiéis servos. Pelos fins do noviciado, Assunta adoeceu gravemente e como se temia perigo de contágio, disseram-lhe que talvez tivesse de voltar temporariamente para casa da família. Foi para ela um tormento inenarrável. Estava disposta a tudo, até a morrer, contanto que fosse na vida religiosa.
       - "Reze comigo à Senhora de Pompéia - dizia suplicante a uma Irmã. Nossa Senhora tudo pode" (o.c., p. 107)."
        A Mãe de Misericórdia e Consoladora dos aflitos atendeu a filha que pôs n'Ela tamanha confiança. Assunta não só recuperou a saúde, mas teve a suprema alegria de fazer os votos no dia 8 de dezembro de 1900, festa da Imaculada Conceição.
          Nesse ano, as Franciscanas Missionárias de Maria ardiam em fervor porque sete delas tinham tido a invejável dita de derramar o seu sangue por Jesus Cristo na missão da China, Este fato vai influir poderosamente no espírito da religiosa para "fazer todas as ações com a maior perfeição possível" como aconselhava a Madre Fundadora. E para que não decaísse o seu fervor, a 8 de dezembro de 1903 pediu licença à mesma Madre para se obrigar por voto a "fazer tudo o melhor que me seja possível com a graça de Deus e por toda a vida".
        A licença foi-lhe concedida e ela, em data que ignoramos, depois de comungar, dirigiu ao Senhor a seguinte prece:
     "Meu Deus, com a Vossa santíssima graça e por intercessão da Santíssima Virgem Imaculada faço voto de fazer tudo por amor de Deus, consagrando-me para sempre ao Sagrado Coração de Jesus com todos os meus pensamentos, palavras e obras que fizer durante a minha vida, e bem assim as que fizer depois da minha morte, a fim de que o Sagrado Coração de Jesus disponha delas como Lhe agradar" (o. c., p. 147-148).
        Há aqui dois atos heróicos: o de "fazer tudo por amor de Deus" e a "entrega ao Coração de Jesus de todos os sufrágios que se façam por ela depois da morte", para que disponha deles como Lhe aprouver. Generosa até ao heroísmo, não quer nada para si, tudo para Deus e em beneficio dos outros.
          Dotada de tão elevado grau de generosidade, não é de estranhar que se oferecesse à Madre Geral para ir para a missão da China "tratar especialmente dos leprosos". O seu pedido foi aceito. Para lá partiu no dia 19 de março de 1904, sem ver a Madre Fundadora e sem abraçar os pais, que por falta de recursos não puderam ir a Roma despedir-se da filha.
        Depois de uma terrível e dolorosa viagem, chegou finalmente à missão. Lá esperava-a nova provação, a noite espiritual, que consistiu em trevas, dúvidas, desalentos, escrúpulos, que "atormentam-na até ao paroxismo. Deus permitiu que ela sofresse um verdadeiro martírio interior" (o. c., p. 201-202). Era a pincelada final do Divino Artista, que preparava esta alma para luzir no candelabro da Igreja. De fato, Maria Assunta viria a falecer antes de completar um ano na missão, vítima do tifo, que também ceifou a vida de outras religiosas.
     Deus quis glorificar a sua humilde serva no próprio momento da morte, pois um perfume, "como uma mistura de violetas e de incenso, que não se assemelha a nada que se conheça" se desprendeu do quarto onde ela faleceu e se fez sentir tão longe, que arrastou "uma multidão de chineses para ver o milagre".
      Quando se exumaram os restos mortais da Serva de Deus, a 23 de abril de 1913, apareceu o corpo de Assunta, intacto e incorrupto. "Quem se humilha será exaltado", proclamou o Divino Mestre. Cumpriu a palavra em Assunta. São Pio X naquele ano começou a ocupar-se do Processo de Beatificação e Canonização
        No dia 7 de novembro de 1954 - Ano Mariano - foi beatificada por Pio XII, na presença de seus irmãos Vicente e Madalena, que viajaram dos EUA a Roma para assistir a beatificação da irmã que deles cuidara quando pequenos. Cerca de um milhar de religiosas da própria Congregação, que nesse ano contava 9400 membros de 64 nacionalidades, com casas em 55 países.