segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Da Carta aos coríntios, de São Clemente I, papa, século I (Cap.19,2-20,12: Funk 1,89)

 
Benfazejo em tudo, Deus dispôs o mundo
com justeza e harmonia

         Consideremos com amor o Pai e Criador do mundo inteiro e unamo-nos com firmezaseus magníficos e desmedidos dons da paz e aos benefícios. Pelo pensamento contemplemo-lo e demoremos o olhar do espírito em sua vontade generosa. Vejamos quão clemente se mostra para com toda criatura sua.
          Os céus movidos por seu governo, se lhe submetem em paz; o dia e a noite, sem se embaraçarem mutuamente, realizam o curso que lhes determinou. O sol, a luz e todo o coro dos astros, em conformidade com sua ordem, desenvolvem, sem se enganar e em concórdia, a disposição para eles fixada. De acordo com a sua vontade, em tempo oportuno, a terra fecunda produz abundante alimento para os homens, as feras e todos os animais que nela existem, sem hesitação, sem alterar nada do que lhe foi ordenado.
          Os inescrutáveis abismos, as regiões inacessíveis do oceano mantêm-se dentro de suas leis. A grandeza do mar imenso, reunida em ondas por sua determinação, não ultrapassa os limites postos a seu redor, mas como lhe ordenou, assim faz. Pois disse: Até aqui virás, e em ti mesmo se quebrarão tuas vagas (Jó 38,11). O oceano intransponível aos homens e os mundos que existem para além dele são governados pelos mesmos decretos do Senhor.
          As estações da primavera, verão, outono e inverno se sucedem em paz umas às outras. Os guardas dos ventos no tempo marcado executam seu encargo sem obstáculo; também as fontes perenes, criadas para o uso e a saúde, oferecem sem falhas sua abundância para o sustento da vida humana; e os animais pequeninos, em paz e concórdia, fazem seus agrupamentos.
           O grande artífice e Senhor de tudo ordenou que estes seres todos se fizessem em paz e concórdia, beneficiando a tudo, porém, com superabundância, a nós, que nos refugiamos em sua misericórdia por nosso Senhor Jesus Cristo, a quem a glória e a majestade pelos séculos dos séculos. Amém.

Santo Afonso Rodrigues

A Companhia de Jesus gerou padres e missionários santos que deixaram a assinatura dos jesuítas na história da evangelização e na história da humanidade. Figuras ilustres que se destacaram pela relevância de suas obras sociais cristãs em favor das minorias pobres e marginalizadas, cujas contribuições ainda florescem no mundo todo.  
O irmão leigo Afonso Rodrigues, natural de Segóvia, Espanha. Nascido em 25 de julho de 1532, pertencia a uma família pobre e profundamente cristã. Após viver uma sucessão de fatalidades pessoais, Afonso encontrou seu caminho na fé.
Tudo começou quando Afonso tinha dezesseis anos. Seu pai, um simples comerciante de tecidos, morreu de repente. Vendo a difícil situação de sua mãe, sozinha para sustentar os onze filhos, parou de estudar. Para manter a casa, passou a vender tecidos, aproveitando a clientela que seu pai deixara.
Em 1555, aconselhado por sua mãe, casou e teve dois filhos. Mas novamente os acontecimentos bateram a sua porta. Primeiro, foi a jovem esposa que adoeceu e morreu; em seguida, faleceram os dois filhos, um após o outro. Abatido pelas perdas, descuidou dos negócios, perdeu o pouco que tinha e, para piorar, ficou sem crédito.
Sem rumo, tentou voltar aos estudos, mas não se saiu bem nas provas e não pôde cursar a Faculdade de Valência.
Afonso entrou, então, numa profunda depressão espiritual. Retirado na própria casa, rezou, meditou muito e resolveu dedicar sua vida completamente a serviço de Deus, servindo aos semelhantes.
Ingressou como irmão leigo na Companhia de Jesus em 1571. E foi um noviciado de sucesso, pois foi enviado para trabalhar no colégio de formação de padres jesuítas em Palma, na ilha de Maiorca, onde encontrou a plena realização da vida e terminou seus dias.
No colégio, exerceu somente a simples e humilde função de porteiro, por quarenta e seis anos. Se materialmente não ocupava posição de destaque, espiritualmente era dos mais engrandecidos entre os irmãos. Recebera dons especiais e muitas manifestações místicas o cercavam, como visões, previsões, prodígios e cura.
E assim, apesar de porteiro, foi orientador espiritual de muitos religiosos e leigos, que buscavam sua sabedoria e conselho. Mas um se destacava. Era Pedro Claver, um dos maiores missionários da Ordem, que jamais abandonou os seus ensinamentos e também ganhou a santidade. Outro foi o missionário Jerônimo Moranto, martirizado no México, que seguiu, sempre, sua orientação.
Afonso sofreu de fortes dores físicas durante dois anos, antes de morrer em 31 de outubro de 1617, lá mesmo no colégio.
Foi canonizado em 1888, pelo papa Leão XIII, junto com são Pedro Claver, seu discípulo, conhecido como o Apóstolo dos Escravos. Santo Afonso Rodrigues deixou uma obra escrita resumida em três volumes, mas de grande valor teológico, onde relatou com detalhes a riqueza de sua espiritualidade mística. A sua festa litúrgica é comemorada no dia de sua morte.

São Wolfgang



 
No final do século I surgiu o novo contorno político dos países da Europa. Entre os construtores desse novo mapa europeu está o bispo são Wolfgang, também venerado como padroeiro dos lenhadores.  
Nascido em 924, na antiga Suábia, região do sudoeste da Alemanha, aos sete anos foi entregue aos cuidados de um sacerdote. Cresceu sendo educado no Convento beneditino de Constança. Considerado uma referência, nos estudos e no seguimento de Cristo, era muito devoto da santíssima Eucaristia e tinha vocação para a vida religiosa.
Saiu do colégio no ano de 956, sem receber ordenação, para ser conselheiro do bispo de Trèves. Cargo que associou ao de professor da escola da diocese, onde arrebatava os alunos com sua sabedoria e empolgante maneira de ensinar.  
Com a morte do bispo em 965, decidiu retirar-se no Mosteiro beneditino da Suíça. Três anos depois, terminado o noviciado, ordenou-se sacerdote e foi evangelizar a Hungria. Na época, esses povos bárbaros tentavam firmar-se como nação, mas continuavam a invadir e saquear os reinos alemães, promovendo grandes matanças dos cristãos.
Wolfgang foi bem aceito e iniciou com sucesso a cristianização dos húngaros, organizando esses povos a se firmarem na terra como agricultores. Assim, começou a mostrar seu valor de pregador, pacificador e diplomata político também. Pouco tempo depois, em 972, era nomeado bispo de Ratisbona. 
Ratisbona, cidade da Baviera, cujos vales dos rios Reno e Naab ligam as terras da Boêmia, que dependiam daquela diocese, ou seja, do bispo Wolfgang.
Lá, novamente, foi mestre e discípulo, professor e aprendiz. Mas foi, principalmente, o grande evangelizador. Caminhava de paróquia em paróquia dando exemplos de religiosidade e caridade, pregando e ensinando a irmãos, padres e leigos.
Criou vários mosteiros, além dos restaurados, das igrejas, hospitais, casas de repouso para velhos e creches para crianças, também fundados e administrados sob sua orientação. Surpreendeu os poderosos da época e até os superiores do clero quando decidiu separar da diocese de Ratisbona as terras da Baviera, para criar uma nova, com sua sede episcopal em Praga. Agiu corretamente e fundou a diocese de Praga, que em 976 teve seu primeiro bispo, Tietemaro, depois sucedido pelo grande santo Alberto, doutor da Igreja.  
Desse modo, robusteceu a missão evangelizadora e o cristianismo firmou raízes nas terras germânicas. Em 974, devido à luta entre Henrique II da Baviera e o imperador Oto II da Alemanha, refugiou-se num mosteiro em Salzburg. Não demorou, ergueu, ali perto, uma igreja dedicada a são João Batista, que depois foi ampliada, reformada e, em sua memória, recebendo o seu nome.
Wolfgang estava fazendo uma viagem evangelizadora pela Áustria quando adoeceu. Morreu alguns dias depois, em Pupping, no dia 31 de outubro de 994.
Foi canonizado em 1052, pelo papa Leão IX. A festa de são Wolfgang, celebrada no dia de sua morte, é uma das mais tradicionais da Igreja, especialmente entre os povos cristãos de língua germânica.

Bem-aventurado Caetano Errico


A cidade de Secondigliano, grande e populosa, do norte de Nápoles, Itália, é mais conhecida como uma região de mafiosos do que de santos.  
Os problemas dos seus habitantes são inúmeros, entre os quais estão as facções da máfia, a corrupção social e política que, somados, desestruturam o sistema de serviços e a consciência, propiciando a formação de gangues de todos os tipos de tráficos. Mas nela encontra-se também boas obras, como a de padre Caetano Errico, que fundou, em 1833, a Congregação dos "Missionários dos Sagrados Corações de Jesus e de Maria".
A estátua de padre Caetano está bem visível a qualquer ângulo da cidade. Com a mão direita, ele abençoa; com a esquerda, empunha o crucifixo. A sua figura é imponente, não apenas pela beleza plástica da escultura. Ele era, realmente, um homem grande, alto e bem forte, um gigante na santidade e na figura humana.  
No ano 1791, a cidade era pequena, uma planície com ar puro e úmido no final da tarde, chamada de Casale Régio da Cidade de Nápoles. Nesse ano Caetano Errico nasceu, no dia 19 de outubro, o segundo dos nove filhos de Pasqual, modesto fabricante de macarrão, e de Maria.
Quando demonstrou vocação para a vida religiosa, logo obteve apoio da família. Aos dezesseis anos, ingressou no seminário e, em 1815, recebeu a ordenação sacerdotal.
Desde então, seu apostolado foi todo feito na igreja paroquial de São Cosme e São Damião, da sua cidade natal.  
Em 1818, durante a pregação, teve inspiração divina para fundar uma congregação religiosa. Iniciou, imediatamente, pela construção de uma igreja dedicada a Nossa Senhora das Dores. Entre inúmeras dificuldades, a igreja foi erguida e abençoada doze anos depois, em 1830. Mas teve que aguardar outros cinco anos para adquirir uma imagem de madeira de Nossa Senhora das Dores e colocá-la no altar, onde permanece até hoje.
Além do trabalho pastoral da igreja, agora Caetano se ocupava com a construção da Casa para abrigar a nova congregação de padres. Decidiu que seria dedicada em honra dos Sagrados Corações de Jesus e Maria. E nela empenhou toda a sua vida, que durou sessenta e nove anos de idade.
Morreu em 29 de outubro de 1860.  
Padre Caetano Errico foi homem de oração, de penitência, dedicava muito tempo ao atendimento das confissões e auxiliava materialmente, com suas obras, os marginalizados e pobres de toda a cidade e redondeza.
Hoje, essa herança é distribuída através dos padres Missionários dos Sagrados Corações. Mas a memória e veneração ao padre Caetano está muito presente e ainda é muito forte na população.
O culto e as graças atribuídas à sua santidade começaram quando ele ainda estava no seu leito de morte. Tanto que no interior da Casa-mãe da Congregação foi preciso instalar um museu para abrigar as doações dos elementos testemunhais dos devotos, que lembram as graças alcançadas.
E é impressionante como o povo não permite que a imagem do fundador seja retirada do altar, onde foi colocada, para a sua simples apresentação, quando chegou. Era para ficar no museu, mas todos a querem ver ali, ao lado de Nossa Senhora das Dores.  
O papa João Paulo II proclamou bem-aventurado Caetano Errico em 2002, e designou o dia de sua morte para a homenagem litúrgica.


Bem-aventurada Retistuta Kafka



 
No dia primeiro de maio de 1894, nasceu Helene, filha de Anton e Maria Kafka, na cidade de Brno, atual República Checa. Naquele tempo, a região chamava-se Moravia, e estava sob o governo do imperador austríaco Francisco José. Em 1896, a família Kafka transferiu-se para Viena, capital do Império Austro-Húngaro.  
Helene formou-se enfermeira, com um desejo de tornar-se religiosa. No início, conformou-se com a reprovação dos pais, mas, ao completar vinte anos, ingressou na Congregação das Franciscanas da Caridade Cristã, agora com a bênção dos pais.
Como religiosa, adotou o nome de irmã Maria Retistuta, o primeiro em homenagem a sua mãe e o segundo a uma mártir do século I.
 Mas logo recebeu o apelido carinhoso de "irmã Resoluta", pelo seu modo cordial e decidido e por sua segurança e competência como enfermeira de sala cirúrgica e anestesista. No hospital de Modling, em Viena, a religiosa tornou-se uma referência para os médicos, enfermeiras e, especialmente, para os doentes, aos quais soube comunicar com lucidez o amor pela vida, na alegria e na dor. Foram muitos anos que serviu a Deus nos doentes, para os quais estava sempre disponível.
Em março de 1938, Hitler mandou o exército ocupar a Áustria. Viena tornou-se uma das bases centrais do comando nazista alemão. Irmã Restituta colocou-se de imediato contrária a toda aquela loucura desumana. Não teve medo de mostrar que, sendo favorável à vida, não apoiaria, jamais, o nazismo de Hitler, fosse qual fosse o preço.  
Por isso, quando os nazistas retiravam o crucifixo também das salas de cirurgia, ela, serenamente, o recolocava no lugar, de cabeça erguida, desafiando os nazistas. Como não se submetia e muito menos se "dobrava", os nazistas a eliminaram. Foi presa em 1942. E ela fez da prisão uma espécie de lugar de graça, para honrar o nome de sua consagração, ou seja, Restituta, aquela que foi restituída para Deus.
Irmã Resoluta esperou cinco meses na prisão para morrer. Em 30 de março de 1943, foi decapitada. Para as franciscanas, mandou uma mensagem: "Por Cristo eu vivi, por Cristo desejo morrer". E na frente dos assassinos nazistas, antes que o carrasco levantasse a mão para o martírio, irmã Restituta disse ao capelão: "Padre, faça-me na testa o sinal da cruz".  
O papa João Paulo II, em 1998, declarou irmã Maria Restituta Kafka como bem-aventurada. A sua festa litúrgica foi marcada para o dia 30 de outubro, data em que foi decretada a sua sentença de morte.

São Narciso, bispo


Os registros da Igreja revelam que na diocese de Jerusalém houve um bispo que foi eleito com quase cem anos de idade. E que ele teria morrido com mais de cento e dezesseis anos. Um fato raro na história da Igreja Católica.  
Conta-se que Narciso, não era judeu e teria nascido no ano 96. A lembrança que se guardou dele é a de um homem austero, penitente, humilde, simples e puro. Também que, desde a infância, tem demonstrado apego à religião, esperou a idade necessária para tornar-se sacerdote.
Executou um trabalho tão admirável, amando os pobres e doentes, que a população logo o quis para conduzir a paróquia de São Tiago. Como bispo, a idade não pesou, governou com firmeza em um longo período marcado por atuações importantes e vários milagres. Presidiu o Concilio em que se decidiu que a Páscoa devia cair no domingo. Diz que foi também na véspera de uma festa de Páscoa que Narciso transformou água em azeite para acender as lamparinas da igreja que estavam secas.  
Um fato marcou tragicamente a vida de Narciso. Ele foi caluniado, sob juramento, por três homens.
Um deles disse: “Que eu seja queimado vivo se estiver mentindo!”
Outro disse: “Que a lepra me devore se eu não estiver falando a verdade!”;
Já o terceiro: “Que eu fique cego se não for verdade o que digo!”.
Embora perdoasse seus detratores, o inocente bispo preferiu retirar-se para o isolamento e em oração num deserto. Mas não tardou para que os caluniadores recebessem seu castigo. Um morreu carbonizado num incêndio, no qual pereceu também toda sua família. O outro ficou leproso e o terceiro chorou tanto em público, arrependido do crime cometido, que ficou cego.  
O bispo Narciso não foi encontrado para reassumir seu cargo e todos pensaram que tivesse morrido. Assim, outro bispo tomou posse em seu lugar, depois outro e mais outro. Anos depois, Narciso retornou a Jerusalém. O povo o acolheu com aclamação e reassumiu com glória as suas funções.
A última notícia que temos desse bispo de Jerusalém está numa carta escrita por santo Alexandre, na qual cita que o longevo bispo Narciso tinha completado cento e dezesseis anos, e, como ele, exortava para que a concórdia fosse mantida.

sexta-feira, 28 de outubro de 2011

Dos Discursos contra os arianos, de Santo Atanásio, bispo (Oratio 2,78.79:PG 26,311.314) (Séc.IV)


Nas coisas criadas está impressa a imagem da Sabedoria

           A forma da sabedoria foi criada em nós e está em tudo. É, portanto, muito justo que a verdadeira e criadora Sabedoria reivindique como própria sua forma em todas as coisas e diga: O Senhor me criou em suas obras (cf. Pr 8,22). Visto ser a sabedoria existente em nós quem fala, o Senhor a nomeia como bem próprio.
           Não é, portanto, criado aquele que é o criador, mas por causa de sua imagem nas obras criadas, fala destas como de si mesmo. Do modo como o Senhor diz: Quem vos recebe a mim recebe (Mt 10,40), porque sua imagem está em nós, embora não incluído entre as coisas criadas, por ser sua forma e imagem criada nas obras, diz como de si mesmo: O Senhor no início de seus caminhos me criou (Pr 8,22).
          A forma da sabedoria foi dada às criaturas para que o mundo nelas reconhecesse o Verbo, seu artífice, e pelo Verbo,o Pai. Na verdade é o mesmo que Paulo ensina: Porque o que se pode conhecer de Deus é manifesto para eles, Deus lhes manifestou. Pois desde a criação do mundo, através de suas criaturas as realidades invisíveis são contempladas pela inteligência (cf. Rm 1,19-20). Por conseguinte, o Verbo, por natureza, de modo algum é criado, mas este trecho deve ser entendido a respeito da sabedoria que se diz estar e ser verdadeiramente em nós.
         Entretanto, se alguém não quiser acreditar nisto, responda-me: há ou não sabedoria nas coisas criadas? Se não há nenhuma, como é que o Apóstolo se queixa com as palavras: Pois que, na sabedoria de Deus, o mundo não conheceu a Deus pela sabedoria? (1Cor 1,21). Ou se não existe sabedoria, por que se comemora na Escritura a multidão dos sábios? Pois o sábio atemorizado afasta-se do mal (Pr 14,16), e com sabedoria constrói a casa (Pr 24,3).
        O Eclesiastes também diz: A sabedoria do homem iluminará seu rosto (Ecl 8,1); e censura os temerários com as palavras: Não digas: Por que é que os tempos passados foram melhores do que os presentes? Não foi com sabedoria que indagaste isto (Ecl 7,10).
         Então, se nas coisas criadas há sabedoria, como o filho de Sirac atesta: Difundiu-a em todas as suas obras e em todos os mortais conforme seu dom, e concedeu-a aos que o amam (Eclo 1,7-8), esta efusão não foi absolutamente da Sabedoria em sua natureza que subsiste por si mesma e é unigênita, mas daquela que se expressa no mundo. Que há, pois, de incrível que a própria Sabedoria criadora e verdadeira diga a respeito da sabedoria e ciência, forma ou figura suas, difundidas no mundo, como se fosse de si mesma: O Senhor me criou em suas obras? A sabedoria existente no mundo não é criadora, mas foi criada nas coisas; por ela os céus narram a glória de Deus e o firmamento anuncia as obras de suas mãos (Sl 18,2).

Do Comentário sobre o Evangelho de João, de São Cirilo de Alexandria, bispo (Séc. V)

Como o Pai me enviou, também eu vos envio

          Nosso Senhor Jesus Cristo designou guias e doutores do mundo e dispensadores de seus divinos mistérios. Semelhantes a lâmpadas, ordenou-lhes que esclarecessem e iluminassem não apenas o país dos judeus, mas todos os que existem sob o sol e em todo o universo, os homens e habitantes da terra. É verdadeiro aquele que disse: Ninguém se arroga esta honra, mas quem foi chamado por Deus (Hb 5,4). Pois nosso Senhor Jesus Cristo chamou ao nobilíssimo apostolado, antes de todos os outros, os seus discípulos.
          Os santos Apóstolos foram colunas e firmamento da verdade. A eles diz que os envia da mesma forma como foi enviado pelo Pai. Mostrou assim, ao mesmo tempo, a dignidade do apóstolo e a glória incomparável do poder que lhe foi dado; como também, parece-me, sugerindo a meta da vida apostólica.
         Pois, se julgava que devia enviar seus discípulos do mesmo modo como o Pai o enviara, como não se seguiria necessariamente que seus futuros imitadores iriam conhecer a que fim o Pai enviara o Filho? Por isto, declarando em vários lugares a finalidade de sua missão, dizia: Não vim chamar os justos, mas os pecadores para a conversão (cf. Mt 9,13). E também: Desci do céu não para fazer minha vontade, mas a vontade daquele que me enviou. Deus não enviou seu Filho ao mundo para julgar o mundo, mas para que o mundo seja salvo por ele (Jo 3,17).
         Resumindo assim, em poucas palavras, o objetivo do apostolado, diz que foram enviados por ele, como ele o fora pelo Pai e soubessem ter recebido a missão de chamar os pecadores à conversão; de curar os doentes de corpo e de espírito; de não procurar, no ministério, sua vontade, mas a daquele por quem foram enviados; e de salvar o mundo por sua doutrina. Não será difícil saber quanto os santos apóstolos se esforçaram por bem realizar todas estas tarefas, se leres os escritos dos Atos dos Apóstolos e de São Paulo.

São Simão, apóstolo, século I



 
Simão também chamado zelota e Cananeu é, talvez, o mais desconhecido dos apóstolos. Aliás, mesmo na Bíblia, recebeu apelidos para ser diferenciado de Simão Pedro. Ele é chamado de Simão, "o cananeu", pelos apóstolos Mateus e Marcos. Alguns estudiosos cristãos entendem que este "cananeu" pode ser uma referência a Canaã, a terra de Israel.  
Mas quando Lucas, no seu Evangelho, o chama de "o zelote", parece querer indicar que Simão pertencera ao partido judeu radical que tinha o mesmo nome. Os radicais zelotes pregavam a luta armada contra os dominadores.
Sabe-se que Simão, como todos os outros apóstolos dos primeiros tempos do cristianismo, depois do Pentecostes percorreu caminhos pregando o Evangelho sem nada levar consigo. Operou muitos milagres, curou enfermos, leprosos e expulsou espíritos maus.
Outros relatos falam da pregação de Simão também no Egito, Líbia e Mauritânia. Segundo Eusébio, idôneo e célebre historiador, Simão teria sido o sucessor de Tiago na cátedra de Jerusalém, nos anos da trágica destruição da cidade santa. 
Uma antiga tradição diz que Simão encontrou-se com o apostolo Judas Tadeu na Pérsia e, desde então, viajaram juntos. Percorreram as doze províncias do Império Persa, deixando o conhecimento histórico e religioso como foi encontrado num antigo livro da época chamado "Atos de Simão e Judas", de autor desconhecido. Nele consta que, no dia 28 de outubro do ano 70, houve o assassinato do apóstolo, preocupados com a eloqüência das pregações que convertiam multidões inteiras. Era apresentado com Nosso Senhor e foi crucificado pelos judeus.

São Judas Tadeu, apóstolo, século I


 
Judas, apóstolo que é celebrado hoje, para não ser confundido com Judas Iscariotes, "apóstolo da perdição", o traidor de Jesus, foi chamado nos evangelhos de Judas Tadeu. O nome Judas vem de Judá e significa festejado. Tadeu quer dizer peito aberto, destemido, melhor ainda, magnânimo.  
Era natural de Caná da Galiléia, na Palestina, filho de Alfeu, também chamado Cléofas, e de Maria Cléofas, ambos parentes de Jesus. O pai era irmão de são José; a mãe, prima-irmã de Maria Santíssima. Portanto Judas era primo-irmão de Jesus e irmão de Tiago, chamado o Menor, também discípulo de Jesus.
Os escritos cristãos dessa época revelam mesmo esse parentesco, uma vez que Judas Tadeu seria um dos noivos do episódio que relata as bodas de Caná, por isso Jesus, Maria e os apóstolos estariam lá.  
Na Bíblia, ele é citado pouco, mas de maneira importante.
No evangelho de Mateus, vemos que Judas Tadeu foi escolhido por Jesus. Enquanto nas escrituras de João ele é narrado mais claramente. Na ceia, Judas Tadeu perguntou a Jesus: "Mestre, por que razão deves manifestar-te a nós e não ao mundo?" Jesus respondeu-lhe que a verdadeira manifestação de Deus está reservada para aqueles que o amam e guardam a sua palavra.
Também faz parte do Novo Testamento a pequena Carta de São Judas, a qual traz os fundamentos para perseverar no amor de Jesus e adverte contra os falsos mestres.
Após ter recebido o dom do Espírito Santo, Judas Tadeu iniciou sua pregação na Galiléia. Realizou inúmeros milagres em sua caminhada pelo Evangelho. Depois, foi para a Samaria e, próximo do ano 50, tomou parte no primeiro Concílio, em Jerusalém. Em seguida, continuou a evangelizar na Mesopotâmia, Síria, Armênia e Pérsia, onde encontrou Simão, e passaram a viajar juntos.  
A tradição conta que São Judas Tadeu percorreu as doze províncias do Império Persa, nas quais pregou a Boa Nova do Evangelho e converteu muitos pagãos.
Ao certo, o que sabemos é que o apóstolo Judas Tadeu tornou-se um mártir da fé, isto é, morreu por amor a Jesus Cristo. A sua pregação e o seu testemunho eram tão intensos que os pagãos se convertiam.
Os sacerdotes pagãos, furiosos, mandaram assassinar o apóstolo, a golpes de bastões, lanças e machados. Tudo teria acontecido no dia 28 de outubro de 70.
Seus restos mortais, guardados primeiro no Oriente Médio e depois na França, agora são venerados em Roma, na Basílica de São Pedro. Considerado pelos cristãos o santo intercessor das causas impossíveis, foi a partir da devoção de santa Gertrudes que essa fama ganhou força no mundo católico. Ela, em sua biografia, relatou que Jesus lhe aconselhou invocar São Judas Tadeu até nos "casos mais desesperados".
Depois disso, aumentou o número de devotos do seu poder de resolver as causas que parecem sem solução. Conta a tradição que não se encontra um devoto que tenha pedido sua ajuda e não tenha sido atendido.
 A festa de São Judas Tadeu é celebrada no dia 28 de outubro, tanto na Igreja ocidental como na oriental. No Brasil, é um evento que altera toda a rotina do país, pois são multidões de católicos que querem agradecer e celebrar o querido santo padroeiro nas igrejas.


quinta-feira, 27 de outubro de 2011

Santo Elesbão


 
No século VI, a nação etíope situada a oeste do Mar Vermelho possuía seus maiores limites de fronteira, era um vasto reino que incluía outros povos além dos etíopes. O soberano era Elesbão, rei católico, contemporâneo do imperador romano Justiniano, muito estimado por todos os súditos e seu reino era uma fonte de propagação da fé cristã.
         O reino vizinho, formado pelos hameritas, era chefiado por Dunaan, que renegara a fé convertendo-se ao judaímo. Na ocasião, mandou matar todos os integrantes do clero e transformou as igrejas em sinagogas, tornando-se temido e famoso por seu ódio declarado aos cristãos.
         Por isso, muitos deles, até o arcebispo Tonfar, buscaram abrigo e proteção nas terras do rei Elesbão, pois até a própria esposa de Dunaan, chamada Duna, foi morta por ele, juntamente com as filhas, por ser cristã. Os registros indicam que houve um verdadeiro massacre, no qual morreram cerca de quatro mil cristãos.
        Elesbão decidiu reagir àquela verdadeira matança imposta aos irmãos católicos e declarou guerra a Dunaan. Liderando seu povo na fé e na luta, ganhou a guerra e a vizinhança passou a ser governada pelo rei Ariato, um cristão fervoroso.
       Mas ele teve de vencer outra batalha ainda maior além dessa travada contra o inimigo, aquela contra si mesmo. Depois de um curto período de muita oração e penitência, aceitou o chamado de Deus. Abdicou do trono em favor do filho, seu sucessor natural, e dividiu seus tesouros entre os súditos pobres. Assim, Elesbão partiu para Jerusalém, onde depositou sua coroa real na igreja do Santo Sepulcro, e retirou-se para o deserto, vivendo como monge anacoreta até morrer em 555.
        No Brasil, a partir dos escravos, foi muito difundida a devoção de santo Elesbão, o rei negro da Etiópia. Sua festa é celebrada em todo o mundo cristão, do Ocidente e do Oriente, no dia 27 de outubro, considerado o dia de sua morte.

São Frumêncio, século IV


 
Desde a adolescência Frumêncio teve sua vida marcada por acontecimentos surpreendentes que o levaram a uma região exótica e distante, a Etiópia, no coração da África, da qual se tornou o primeiro bispo. Antes disso, porém, foi discípulo de filósofo, e um escravo muito especial.
         Era o tempo do imperador Constantino e Frumêncio estava entre os discípulos na comitiva que acompanhava o filósofo Merópio. Voltavam de uma viagem à Ìndia e a embarcação parou no porto de Adulis, no mar Vermelho. Então, foram atacados por ladrões etíopes, que saquearam o barco e mataram os passageiros e tripulantes. Todos, exceto os amigos adolescentes, Frumêncio e Edésio. Os dois foram salvos por um motivo banal: naquele momento estavam sob uma árvore, entretidos na leitura de um livro. Sobreviveram, porém foram levados para a Etiópia e entregues ao rei, como escravos.
        Depois de conversar com eles e admirar-se com sua sabedoria, o rei decidiu mantê-los no palácio. Edésio como copeiro e Frumêncio como um secretário direto. Sua influência cresceu na Corte, principalmente junto à rainha. Ao tornar-se viúva, ela assumiu o poder para o filho menor, como regente. Libertou Frumêncio e Edésio, entregando-lhes a educação de seu filho, o futuro rei. Ou seja: só poderiam partir ao concluírem a tarefa.
        Tempos depois, eles conseguiram da rainha autorização para construir uma igreja próxima ao porto, para servir os mercadores cristãos que passavam pelo país. Isso muito significou para a difusão da fé cristã junto ao povo etíope, embora com dificuldade. Lentamente, foi nela que a semente do cristianismo germinou no continente africano.
         No tempo certo, obtiveram permissão de voltar à pátria, o Tiro, no sul da Síria, atual Líbano. Enquanto Edésio se dirigia para a cidade natal, onde se encontrou como o historiador, hoje santo, Rufino, que registrou toda a aventura, o amigo Frumêncio foi para Alexandria, no Egito. Queria pedir ao então bispo, santo Atanásio, que designasse um bispo e missionários para comandar a pregação católica na Etiópia. Atanásio não se fez de rogado, entendendo que o mais indicado era o próprio Frumêncio. Consagrou-o bispo da Etiópia.
        Quando retornou, Frumêncio encontrou no trono da Etiópia o jovem rei seu pupilo, que lhe dedicava grande estima, que logo em seguida se converteu e foi batizado, convidando todo o seu povo a acompanhá-lo no seguimento de Cristo.
       Frumêncio, chamado pelos etíopes de "Abba Salama", ou seja, "Pai da Paz", desenvolveu seu trabalho missionário na Etiópia até morrer no ano 380. A Igreja comemora no dia 26 de outubro aquele que considera o "Apóstolo da Etiópia".

quarta-feira, 26 de outubro de 2011

Santo Evaristo, Papa, mártir, Século I e II


No atual Anuário dos Papas encontramos Evaristo em pleno comando da Igreja católica, como quarto sucessor de Pedro, no ano 97. Era o início da era cristã, portanto é muito compreensível que haja tão poucos dados sobre ele.
         Enquanto do anterior, papa Clemente, temos muitos registros, até de próprio punho, como a célebre carta endereçada aos cristãos de Corinto, do papa Evaristo nada temos escrito por ele mesmo, as poucas informações vieram de Irineu e Eusébio, dois ilustres e expressivos santos venerados no mundo católico.
         Naqueles tempos, o título de "papa" era dado a toda e qualquer autoridade religiosa, passando a designar o chefe maior da Igreja somente no século VI. Por essa razão as informações, às vezes, se contradizem. Mas santo Eusébio mostra-se muito firme e seguro ao relatar Evaristo como um grego vindo da Antioquia.
       Ele governou a Igreja durante nove anos, nos quais promoveu três ordenações, consagrando dezessete sacerdotes, nove diáconos e quinze bispos, destinados a diferentes paróquias.
       Foi de sua autoria a divisão de Roma em vinte e cinco dioceses, a criação do primeiro Colégio dos Cardeais. Parece que também foi ele que instituiu o casamento em público, com a presença do sacerdote.
       Papa Evaristo morreu em 105. Uma tradição muito antiga afirma que ele teria sido mártir da fé durante a perseguição imposta pelo imperador Trajano, e que depois seu corpo teria sido abandonado perto do túmulo do apóstolo Pedro. Embora a fonte não seja precisa, assim sua morte foi oficialmente registrada no Livro dos Papas, em Roma.

São Gaudêncio


Gaudêncio era um homem muito simples, nascido no século IV, em Brescia, Itália. A exemplo de seu nome, que em latim quer dizer alegria constante, era dessa maneira que pregava o evangelho de Cristo, como membro do clero. Mas acabou sendo um grande escritor, que muito colaborou para a Igreja, tendo sido, também, o oitavo bispo de sua cidade natal. Entretanto nunca imaginou ou almejou qualquer uma dessas duas possibilidades.
          Humilde e modesto, não pensava que pudesse escrever uma linha que fosse, ainda mais sobre as Sagradas Escrituras. Sabia apenas que possuía um dom extraordinário para a oratória, pois seus discursos e sermões atraíam multidões. Assim, achava que somente sua palavra oral era suficiente para o seu apostolado.
          A ação de Deus ocorreu, como sempre e em tudo, naturalmente. Certa vez, por ocasião da Páscoa, um amigo apreciador e ouvinte assíduo de seus sermões não pôde participar das solenidades, nas quais Gaudêncio era um dos principais oradores. Então, ele pediu que lhe mandasse por escrito os dez sermões que havia feito. Foi assim que Gaudêncio revelou-se um exímio escritor.
         Depois, os discursos copiados a mão começaram a ser divulgados e passaram a ajudar muitos sacerdotes no púlpito. De maneira que Gaudêncio começou a receber inúmeras correspondências de leitores que pediam explicações, e sua obra escrita tornou-se volumosa. Nos tempos atuais, existem pouco mais de vinte sermões de são Gaudêncio. O restante foi destruído em saques, violações e incêndios patrocinados pelos conquistadores pagãos ao longo dos séculos.
        Quanto a ser bispo de Brescia, ele foi eleito pela população, para suceder o bispo Filástrio, seu amigo e admirador, falecido em 387. Gaudêncio estava em peregrinação nos lugares santos da Palestina, foi informado na sua viagem de retorno e não queria o cargo em hipótese alguma. Foram os amigos influentes do clero, como santo Ambrósio, bispo de Milão, que o forçaram a aceitar, porque sabiam do seu valor.
       A pedido do papa Inocêncio I, ele integrou a comitiva de bispos enviada a Constantinopla, e que teve de retornar com a missão de ajudar João Crisóstomo. Gaudêncio gozava de fama de grande erudição e santidade, junto ao povo e ao clero, por isso teve a estima de grandes personalidades religiosas e leigas do seu tempo. Morreu em 410, deixando sua marca na história da Igreja e da humanidade.
        Foi sepultado na igreja de São João Evangelista de Brescia e cedo o seu culto propagou-se. A Igreja confirmou e incluiu a festa de são Gaudêncio no seu calendário litúrgico em 25 de outubro.


São Crispim e são Crispiniano, século III


Crispim e Crispiniano eram irmãos de origem romana. Cresceram juntos e converteram-se ao cristianismo na adolescência. Ganhando a vida no oficio de sapateiro, eram muito populares, caridosos, e pregavam com ardor a fé que abraçaram. Quando a perseguição aos cristãos ficou mais insistente, os dois foram para a Gália, atual França.
        As tradições seculares contam que, durante a fuga, na noite de Natal, os irmãos Crispim e Crispiniano batiam nas portas buscando refúgio, mas ninguém os atendia. Finalmente, foram abrigados por uma pobre viúva que vivia com um filho. Agradecidos a Deus, quiseram recompensá-la fazendo um novo par de sapatos para o rapazinho.
        Trabalharam rápido e deixaram o presente perto da lareira. Mas antes de partir, enquanto todos ainda dormiam, Crispim e Crispiniano rezaram pedindo amparo da Providência Divina para aquela viúva e o filho. Ao amanhecer, viram que os dois tinham desaparecido e encontraram o par de sapatos cheio de moedas.
         Quando alcançaram o território francês, os dois irmãos estabeleceram-se na cidade de Soissons. Lá, seguiram uma rotina de dupla jornada, isto é, de dia eram missionários e à noite, em vez de dormir, trabalhavam numa oficina de calçados para sustentar-se e continuar fazendo caridade aos pobres. Quando a cruel perseguição imposta por Roma chegou a Soissons, era época do imperador Diocleciano e a Gália estava sob o governo de Rictiovaro. Os dois irmãos foram acusados e presos. Seus carrascos os torturaram até o limite, exigindo que abandonassem publicamente a fé cristã. Como não o fizeram, foram friamente degolados, ganhando a coroa do martírio.
          O Martirológio Romano registra que as relíquias dos corpos desses dois nobres romanos mártires estavam sepultadas na belíssima igreja de Soissons, construída no século VI. Depois, parte delas foi transportada para Roma, onde foram guardadas na igreja de São Lourenço da via Panisperna.
          A Igreja celebra os santos Crispim e Crispiniano como padroeiros dos sapateiros no dia 25 de outubro. Essa profissão, uma das mais antigas da humanidade, era muito discriminada, por estar sempre associada ao trabalho dos curtidores e carniceiros. Mas o cristianismo mudou a visão e ela foi resgatada graças ao surgimento dos dois santos sapateiros, chamados de mártires franceses.


Santo Antonio de Sant'Anna Galvão



 
O brasileiro Antônio de Sant'Anna Galvão nasceu em 1739, em Guaratinguetá, São Paulo. Seu pai era Antônio Galvão de França, capitão-mor da província e terciário franciscano. Sua mãe era Isabel Leite de Barros, filha de fazendeiros de Pindamonhangaba. O casal teve onze filhos. Eram cristãos caridosos, exemplares e transmitiram esse legado ao filho.
        Quando tinha treze anos, Antônio foi enviado para estudar com os jesuítas, ao lado do irmão José, que já estava no Seminário de Belém, na Bahia. Desse modo, na sua alma estava plantada a semente da vocação religiosa. Aos vinte e um anos, Antônio decidiu ingressar na Ordem franciscana, no Rio de Janeiro. Sua educação no seminário tinha sido tão esmerada que, após um ano, recebeu as ordens sacerdotais, em 1762. Uma deferência especial do papa, porque ele ainda não tinha completado a idade exigida.
        Em 1768, foi nomeado pregador e confessor do Convento das Recolhidas de Santa Teresa, ouvindo e aconselhando a todos. Entre suas penitentes encontrou irmã Helena Maria do Sacramento, figura que exerceu papel muito importante em sua obra posterior.
        Irmã Helena era uma mulher de muita oração e de virtudes notáveis. Ela relatava suas visões ao frei Galvão. Nelas, Jesus lhe pedia que fundasse um novo Recolhimento para jovens religiosas, o que era uma tarefa difícil devido à proibição imposta pelo marquês de Pombal em sua perseguição à Ordem dos jesuítas. Apesar disso, contrariando essa lei, frei Galvão, auxiliado pela irmã Helena, fundou, em fevereiro de 1774, o Recolhimento de Nossa Senhora da Conceição da Divina Providência.
       No ano seguinte, morreu irmã Helena. E os problemas com a lei de Pombal não tardaram a aparecer. O convento foi fechado, mas frei Galvão manteve-se firme na decisão, mesmo desafiando a autoridade do marquês. Finalmente, devido à pressão popular, o convento foi reaberto e o frei ficou livre para continuar sua obra. Os seguintes quatorze anos foram dedicados à construção e ampliação do convento e também de sua igreja, inaugurada em 1802. Quase um século depois, essa obra tornar-se-ia um "patrimônio cultural da humanidade", por decisão da UNESCO.
       Em 1811, a pedido do bispo de São Paulo, fundou o Recolhimento de Santa Clara, em Sorocaba. Lá, permaneceu onze meses para organizar a comunidade e dirigir os trabalhos da construção da Casa. Nesse meio tempo, ele recebeu diversas nomeações, até a de guardião do Convento de São Francisco, em São Paulo.
      Com a saúde enfraquecida, recebeu autorização especial para residir no Recolhimento da Luz. Durante sua última enfermidade, frei Galvão foi morar num pequeno quarto, ajudado pelas religiosas que lhe prestavam algum alívio e conforto. Ele faleceu com fama de santidade em 23 de dezembro de 1822. Frei Galvão, a pedido das religiosas e do povo, foi sepultado na igreja do Recolhimento da Luz, que ele mesmo construíra.
      Depois, o Recolhimento do frei Galvão tornou-se o conhecido Mosteiro da Luz, local de constantes peregrinações dos fiéis, que pedem e agradecem graças por sua intercessão. Frei Galvão foi beatificado pelo papa João Paulo II em 25 de outubro de 1998, e canonizado em 11 de maio de 2007 pelo papa Bento XVI, em São Paulo, Brasil.

segunda-feira, 24 de outubro de 2011

São Luis Guanella, sacerdote e fundador



 Luís Guanella nasceu no dia 19 de dezembro de 1842, em Franciscio Campodolcino, uma região montanhosa no norte da Itália. A sua família era numerosa e de poucos recursos. Do pai, Lourenço, herdou o caráter forte e tenaz do montanhês; da mãe, Maria, a gentileza e a compaixão para com os pobres; de ambos, herdou a fé robusta, o amor à oração e a confiança na Providência Divina.
         Logo percebeu sua vocação para o sacerdócio, pois o seu coração e a sua mente estavam sempre repletos do desejo de ajudar os pobres e doentes. Por isso, no colégio e no seminário diocesano, fez os estudos preparatórios para o sacerdócio e, em 1866, foi ordenado sacerdote.
         Dom Guanella exerceu seu ministério em pequenas paróquias. Entretanto, movido por um impulso interior, procurou seu caminho ao lado do agora santo João Bosco, o Apóstolo da Juventude, que o acolheu. João Bosco foi seu orientador e conselheiro durante três anos. Com ele, dom Guanella reforçou ainda mais o seu zelo de pastor de almas, já que, além do bem espiritual dos seus paroquianos, preocupava-se com a sua promoção humana e social.
         Foi chamado e voltou a trabalhar na diocese com confiança e esperança, aguardando a hora da misericórdia de Deus para iniciar aquelas obras de caridade. Mas teve de esperar muito. E seu caminho foi de difíceis provações; sofrendo perseguições políticas e sociais, provando, muitas vezes, o sentimento de solidão e desânimo.
        Dom Guanella sempre via desfazerem-se todas as tentativas de iniciar sua obra. Mas forte na fé, perseverou. Só depois de vinte anos de ministério conseguiu autorização do bispo para abrir, na cidade de Como, uma Casa onde abrigaria os marginalizados pela sociedade, os velhos abandonados, os deficientes físicos e mentais, as crianças órfãs etc.
         No início, a Obra foi humilde, mas cresceu robusta. Logo foram abertas várias casas. Em seguida, fundou uma Congregação religiosa feminina, as "Filhas de Santa Maria da Providência", e uma masculina, a "Congregação dos Servos da Caridade", para o atendimento integral da Obra.
        Ainda em vida o fundador viu a família guaneliana cruzar as fronteiras da Itália e depois cruzar os oceanos. Atualmente, a obra de dom Guanella continua, graças à presença de seus filhos e filhas espalhados nos quatro continentes, em mais de vinte nações, entre as quais estão Brasil, Paraguai, Argentina, Chile, Colômbia, Guatemala, México e Estados Unidos.
        Ele faleceu com setenta e três anos de idade, na cidade de Como, Itália, no dia 24 de outubro de 1915. O papa Paulo VI beatificou dom Luís Guanella em 1964, em Roma. A sua família religiosa e os fiéis celebram a sua memória no dia de sua morte. Foi canonizado pelo Papa Bento XVI, aos 23 de outubro de 2011, em Roma.

Santo Antônio Maria Claret

 


Dezembro de 1807, no povoado de Sallent, diocese de Vic, Barcelona, Espanha. Foi batizado no dia de Natal e recebeu o nome de Antônio Claret y Clara. Na família, aprendeu o caminho do seguimento de Cristo, a devoção a Maria e o profundo amor à eucaristia.
         Cedo aprendeu a profissão do pai e depois a de tipógrafo. Na adolescência, ouviu o chamado para servir a Deus. Assim, acrescentou o nome de "Maria" ao seu, para dar testemunho de que a ela dedicaria sua vida de religioso. E foi uma vida extraordinária dedicada ao próximo. Antônio Maria Claret trabalhou com o pai numa fábrica de tecidos e, aos vinte e um anos, depois de ter recusado empregos bem vantajosos, ingressou no Seminário de Vic, pois queria ser monge cartuxo. Mas lá percebeu sua vocação de padre missionário.
         Em 1835, recebeu a ordenação sacerdotal e foi nomeado pároco de sua cidade natal. Quatro anos depois, foi para Roma e dirigiu-se à Propaganda Fides, onde se apresentou para ser missionário apostólico. Foram anos de trabalho árduo e totalmente dedicado ao ministério pastoral na Espanha, que muitos frutos trouxeram para a Igreja. Em 1948, foi enviado para a difícil região das Ilhas Canárias.
       No entanto ansiava por uma obra mais ampla e assim, em 1849, na companhia de outros cinco jovens sacerdotes, fundou a Congregação dos Missionários Filhos do Imaculado Coração de Maria, ou Padres Claretianos. Entretanto, nessa ocasião, a Igreja vivia um momento de grande dificuldade na distante diocese de Cuba, que estava vaga havia quatorze anos. No mesmo ano, o fundador foi nomeado arcebispo de lá. E mais uma vez pôde constatar que Maria jamais o abandonava.
       Era uma vítima constante de todo tipo de pressão das lojas maçônicas, que faziam oposição violenta contra o clero, além dos muitos atentados que sofreu contra a sua vida. Incendiaram uma casa que se hospedava, colocaram veneno em sua comida e bebida, assaltaram-no à mão armada e o feriram várias vezes.
      Mas monsenhor Claret sempre escapou ileso e continuou seu trabalho, sem nunca recuar. Restaurou o antigo seminário cubano, deu apoio aos negros e índios, escravos Em 1855, junto com madre Antônia Paris, fundou outra congregação religiosa, a das Irmãs de Ensino Maria Imaculada, ou Irmãs Claretianas. Fez visitas pastorais a todas as dioceses, levando nova força e ânimo, para o chamado ao trabalho cada vez mais difícil e cada vez mais necessário. Quando voltou a Madri em 1857, deixou a Igreja de Cuba mais unida, mais forte e resistente.
       Voltou à Espanha porque a rainha Isabel II o chamou para ser seu confessor. Mesmo contrariado, aceitou. Nesse período, sua obra escrita cresceu muito, enriquecida com seus inúmeros sermões. Em 1868, solidário com a soberana, seguiu-a no exílio na França, onde permaneceu ao lado da família real. Contudo não parou seu trabalho de apostolado e de escritor por excelência. Encontrou, ainda, tempo e forças para fundar uma academia para os artistas, que colocou sob a proteção de são Miguel.
      Morreu com sessenta e três anos, no dia 24 de outubro de 1870, no Mosteiro de Fontfroide, França, deixando-nos uma importante e numerosa obra escrita. Beatificado pelo papa Pio XI, que o chamou de "precursor da Ação Católica do mundo moderno", foi canonizado em 1950 por Pio XII. Santo Antônio Maria Claret é festejando no dia de sua morte.


Papa Bento XVI na Canonização de três novos Santos.

23.10.2011 - Cidade do Vaticano – Na manhã deste domingo, na Praça São Pedro, S.S. o Papa Bento XVI celebrou o Santo Sacrifício da Missa de canonização de três novos Santos da Igreja Católica. São eles: o Bispo Guido Maria Conforti, o sacerdote Luis Guanella (ambos italianos) e a religiosa Bonifácia Rodriguez de Castro (espanhola).
Venerados Irmãos no Episcopado e no Sacerdócio,
Queridos irmãos e irmãs!
         A nossa Liturgia dominical se enriquece hoje por diversos motivos de agradecimento e súplica a Deus. Enquanto, de fato, celebramos com toda a Igreja o Dia Missionário Mundial - evento que pretende revelar o impulso e o compromisso com a missão -, louvamos ao Senhor por três novos Santos: o Bispo Guido Maria Conforti, o sacerdote Luigi Guanella e a religiosa Bonifacia Rodríguez de Castro.
       Com alegria dirijo minha saudação a todos os presentes, em particular às Delegações oficiais e aos numerosos peregrinos vindos para festejar esses três exemplares discípulos de Cristo.
       A Palavra do Senhor, ressoada há pouco no Evangelho, recordou-nos que toda a Lei divina resume-se no amor. O Evangelista Mateus narra que os fariseus, após Jesus ter reduzido os saduceus ao silêncio, reuniram-se para colocá-lo à prova (cfr 22,34-35).
       Um desses interlocutores, um Doutor da Lei, pergunta-lhe: "Mestre, na Lei, qual é o grande mandamento?" (v. 36). À pergunta, propositadamente insidiosa, Jesus responde com absoluta simplicidade: "Amarás o Senhor teu Deus com todo o teu coração, com toda a tua alma e com toda a tua mente. Esse é o grande e primeiro mandamento" (vv. 37-38).
       Com efeito, a exigência principal para cada um de nós é que Deus esteja presente na  nossa vida. Ele deve, como diz a Escritura, penetrar todos os cantos do nosso ser e preencher-nos completamente: o coração deve saber d'Ele e deixar-se tocar por Ele; e assim também a alma, as energias do nosso querer e decidir, bem como a inteligência e o pensamento. É um poder dizer como São Paulo: "não sou mais eu quem vivo, mas é Cristo que vive em mim" (Gal 1,20).
       Logo depois, Jesus acrescenta algo que, na verdade, não foi pedido pelo doutor da lei: "O segundo, pois, é similar a esse: Amarás o teu próximo como a ti mesmo" (v. 39). Declarando que o segundo mandamento é similar ao primeiro, Jesus leva a entender que a caridade pelo próximo é tão importante quando o amor a Deus. De fato, o sinal visível que o cristão pode mostrar para testemunhar ao mundo o amor de Deus é o amor pelos irmãos.
     Quão providencial resulta, portanto, o fato de que exatamente hoje a Igreja indique a todos os seus membros três novos Santos, que se deixaram transformar pela caridade divina e a essa dedicaram toda a existência. Em diversas situações e com diversos carismas, amaram o Senhor com todo o coração e o próximo como a si mesmos "a ponto de se tornarem modelo para todos os crentes" (1Ts 1,7).
     O Salmo 17, há pouco proclamado, convida a abandonar-se com confiança nas mãos do Senhor, que é "fiel ao seu consagrado" (v. 51). Essa atitude interior guiou a vida e o ministério de São Guido Maria Conforti. Desde quando, ainda criança, teve que superar a oposição do pai para entrar no Seminário, deu prova de um caráter firme no seguir a vontade de Deus, no corresponder por completo àquela caritas Christi que, na contemplação do Crucificado, o atraía a si.
     Ele sente forte a urgência de anunciar este amor a quantos ainda não receberam o anúncio, e o lema "Caritas Christi urget nos" (cfr 2Cor 5,14) sintetiza o programa do Instituto missionário a que ele, com apenas trinta anos, deu vida: uma família religiosa colocada inteiramente a serviço da evangelização, sob o patrocínio do grande apóstolo do Oriente, São Francisco Xavier.
     Esse impulso apostólico, São Guido Maria foi chamado a vivê-lo no ministério episcopal, primeiro em Ravenna e depois em Parma: com todas as suas forças, dedicou-se ao bem das almas a ele confiadas, sobretudo aquelas que estavam distantes do caminho do Senhor. A sua vida foi assinalada por numerosas provas, também graves.
     Ele soube aceitar cada situação com docilidade, acolhendo-a como indicação do caminho traçado por ele pela providência divina; em cada circunstância, também nas situações mais mortificantes, soube reconhecer o plano de Deus, que o guiava para edificar o seu Reino, sobretudo na renúncia a si mesmo e na aceitação cotidiana da sua vontade, com um abandono confiante sempre mais pleno.
      Ele, por primeiro, experimentou e testemunho aquilo que ensinava aos seus missionários, ou seja, que a perfeição consiste no fazer a vontade de Deus, sob o modelo de Jesus Crucificado. São Guido Maria Conforti manteve fixo o seu olhar interior na Cruz, que docilmente o atraía a si; ao contemplá-la, ele via abrirem-se os horizontes do mundo inteiro, escorria o "urgente" desejo, escondido no coração de cada homem, de receber e acolher o anúncio do único amor que salva.

      O testemunho humano e espiritual de São Luigi Guanella é, para toda a Igreja, um particular dom de graça. Durante a sua existência terrena, ele viveu com coragem e determinação o Evangelho da Caridade, o "grande mandamento" que também hoje a Palavra de Deus nos recordou.
     Graças à profunda e contínua união com Cristo, na contemplação do seu amor, Dom Guanella, guiado pela Providência divina, tornou-se companheiro e mestre, conforto e alívio dos mais pobres e fracos. O amor de Deus animava nele o desejo do bem pelas pessoas que lhe eram confiadas, na concretude do viver cotidiano.
     Premurosa atenção dedicava a cada um, respeitando seus tempos de crescimento e cultivando no coração a esperança de que cada ser humano, criado à imagem e semelhança de Deus, saboreando a alegria de ser amado por Ele - Pai de todos -, pode buscar e dar aos outros o melhor de si.
     Desejamos hoje louvar e agradecer ao Senhor porque, em São Luigi Guanella, deu-nos um profeta e um apóstolo da caridade. No seu testemunho, tão carregado de humanidade e de atenção pelos últimos, reconhecemos um sinal luminoso da presença e da ação benéfica de Deus: o Deus - como ressoou na primeira Leitura - que defende o forasteiro, a viúva, o órfão, o pobre que deve dar como garantia a própria capa, a única coberta que tem para se cobrir à noite (cfr. Ex. 22,20-26).
     Esse novo Santo da caridade seja para todos, em particular para os membros das Congregações por ele fundadas, modelo de profunda e fecunda síntese entre contemplação e ação, assim como ele mesmo a viveu e colocou em ação. Toda a sua existência humana e espiritual a podemos sintetizar nas últimas palavras que pronunciou no leito de morte: "in caritate Christi".
      É o amor de Cristo que ilumina a vida de cada homem, revelando como, no dom de si ao outro, não se perde nada, mas se realiza plenamente a nossa verdadeira felicidade. São Luigi Guanella nos alcance crescer na amizade com o Senhor para sermos, no nosso tempo, portadores da plenitude do amor de Deus, para promover a vida em toda a sua manifestação e condição, e fazer assim que a sociedade humana torne-se sempre mais a família dos filhos de Deus.
     Na segunda Leitura, escutamos uma passagem da Primeira Carta aos Tessalonicenses, um texto que usa a metáfora do trabalho manual para descrever a ação evangelizadora e que, de certo modo, pode aplicar-se também às virtudes de Santa Bonifacia Rodríguez de Castro.
     Quando São Paulo escreve a carta, trabalhe para ganhar o pão; parece evidente, pelo tom e exemplos empregados, que é no trabalho que ele prega e encontra seus primeiros discípulos. Esta mesma intuição moveu a Santa Bonifacia, que desde o início soube aliar seu seguimento a Jesus Cristo com o esmerado trabalho cotidiano.
     Pescar, como fazia desde pequena, não era somente um modo para não ser um fardo para ninguém, mas supunha também ter a liberdade para realizar sua própria vocação, e lhe dava, ao mesmo tempo, a possibilidade de atrair e formar a outras mulheres, que, na oficina, podem encontrar a Deus e escutar seu chamado amoroso, discernindo seu projeto de vida e capacitando-se para levá-lo a cabo.
     Assim nascem as Servas de São José, em meio à humildade e simplicidade evangélica, que, no lar de Nazaré, apresenta-se como uma escola de vida cristã. O Apóstolo continua dizendo, em sua carta, que o amor que tem pela comunidade é um esforço, uma fadiga, pois supõe sempre imitar a entrega de Cristo pelos homens, não esperando nada nem buscando outra coisa senão agradar a Deus.
     Madre Bonifacia, que se consagra com entusiasmo ao apostolado e começa a obter os primeiros frutos de seu trabalho, vive também esta experiência de abandono, de rechaço precisamente de suas discípulas, e nisso aprende uma nova dimensão do seguimento de Cristo: a Cruz. Ela a assume com a resistência que dá esperança, oferecendo sua vida pela unidade da obra nascida de suas mãos.
     A nova Santa se nos apresenta como um modelo acabado em que ressoa o trabalho de Deus, um eco que chama a suas filhas, as Servas de São José, e também a todos nós, a acolher seu testemunho com a alegria do Espírito Santo, sem temer a contrariedade, difundindo em todas as partes a Boa-Nova do Reino dos céus.
     Encomendamo-nos à sua intercessão, e pedimos a Deus por todos os trabalhadores, sobretudo pelos que desempenham os ofícios mais modestos e em ocasiões não suficientemente valorizados, para que, em meio de seu afazer diário, descubram a mão amiga de Deus e deem testemunho de seu amor, transformando seu cansaço em um canto de louvor ao Criador.
    "Te amo, Senhor, minha força". Assim, queridos irmãos e irmãs, aclamamos com o Salmo responsorial. De tal amor apaixonado por Deus são sinal eloquente esses três novos Santos. Deixemo-nos atrair por seus exemplos, deixemo-nos guiar por seus ensinamentos, a fim de que a nossa existência torne-se testemunho de autêntico amor por Deus e pelo próximo.
     Alcance-nos esta graça a Virgem Maria, a Rainha dos Santos, e também a intercessão de São Guido Maria Conforti, de São Luigi Guanella e de Santa Bonifacia Rodríguez de Castro. Amém.
Fonte: Boletim da Sala de Imprensa da Santa Sé.