segunda-feira, 20 de junho de 2011

São Máximo, Confessor (580-662)

 
Tropário de São Máximo, o Confessor    
  
      Guia da Ortodoxia, mestre de piedade, luminar do universo, ornamento dos monges, inspirado de Deus, sapiente Máximo, pelos teus ensimamentos iluminastes o mundo inteiro, óh Lira do Espírito. Roga a Cristo nosso Deus que salve as nossas almas.
               Nasceu em Constantinopla em 580 de familia aristocrática de quem recebeu uma educação privilegiada. (Existe uma outra versão de que teria nascido na Palestina, segundo fontes siríacas)
         Foi convocado a Corte Imperial e tornou-se o primeiro secretário do Imperador Heráclio; destinado a exercer altas funções, a existência mundana parecía-lhe medíocre.
     Sentindo-se vocacionado à vida espiritual abandonou tudo e escolheu a vida monástica no Mosteiro de Crisópolis onde permanece até 615.
        Em agosto de 615 parte para o mostério de S. George em Cízico, onde permanece até a invasão de persas e ávaros. Passa por Creta em 628. Em Pentecostes de 632 está em Cartago na África e provávelmente em Chipre em 630.
     No período africano continúa a vida monástica e em 641 empreende uma luta contra o monofisismo e a nascente heresía do monoergismo e monotelismo.
     Neste período existe uma forte discussão na Igreja sobre o monofisismo e a unidade política do Imperio bizantino depende da unidade religiosa.
     Em julho de 645 o Patriarca Pirro chega a África para dirimir a heresia monofisita com S. Máximo numa disputa pública, da qual se têm a transcripção inteira.
     Nessa disputa diante do governador e inúmeros bispos africanos S. Máximo convence Pirro do seu erro.
       Neste período desenvolve intensa atividade contra o monotelismo mediante escritos e conversações. Em junho de 653 é aprisionado em Roma por ordem do Imperador Constâncio junto ao Papa Martinho.
      Em junho de 654 sofre o primeiro processo político e posterior exilio em Byzia na Trácia. Em 656 tenta-se convence-lo a abandonar suas posições e sofre um sugundo exílio em Perberis.
      Chamado a Constantinopla em 658 é condenado pelo sínodo no ano de 662. O castigo imposto é a pena iraniana, que consiste na amputação dos membros com os quais defende sua doutrina: a lingua que profesa a fé reta e a mão direita que escreve.
      Em conseqüência destes tormentos morre no exílio em Lazika, na costa do Mar Negro em 13 de agosto de 662.

Obras Principais:

      Os tomos 90 e 91 da Patrologia grega de Migne, 1863 París, recolhem uma edição do conjunto das suas obras.
      Ambigua: é sua obra mestra onde manifesta sua profundidade e agudeza especulativa e riqueza de análise (Gatti, Milão 1987) composto de dois conjuntos de trabalhos que contêm uma refutação dos origenistas.
      Segundo Von Balthasar “o único lugar na patristica grega onde se refuta o erro origenista desde uma compreensão acabada de Orígenes.
      As 79 Questiones et Dúbia: trata de várias questões teológicas e escriturísticas, sendo frequentemente respostas breves como a pregunta.
         As 65 Questiones at Thalassium: são respostas mais extensas a questões sobre a interpretação de diversas passagens bíblicas onde encontra-se a doutrina espiritual do Confessor. Junto com Ambigua é a mais relevante obra teológica.
     As 03 Questiones ad Theopemtum, com as outras duas obras integra um conjunto de gênero muito extendido de “questiones et responsiones”
     200 Capita theologica et econômica onde toma abundantes elementos de Orígenes e Evágrio Pôntico.
     Diálogo Ascético, ano 626: escrito dentro da grande tradição monástica têm como tema a captação do misterio da caridade como resposta à questão ascética (o exercício da vida espiritual) como uma referência ao mistério de Cristo.
       Centúrias sobre a Caridade: obra destinada ao mesmo destinatário do Diálogo Ascético, Elpídio e têm como tema central a caridade desenvolvida em 400 capítulos ascético-espirituais, muito em voga na literatura monástica de caráter sapiencial. Trata-se da sabedoria acumulada durante séculos de experiência monástica e têm um claro sentido mnemotécnico.
     Do período africano e sua ativa luta contra o monofisismo, o nascente monoergismo e monotelismo são os tratados espirituais:
     Interpretação do Pai Nosso escrita no período 628-630, onde apresenta uma síntese da filosofia dos primeiros séculos da nossa era. De uma filosofia como via de transformação que se chama de theosis ou divinização.
     Esta divinização é progressiva e o comentário sobre o Pai Nosso descreve perfeitamente as etapas necessárias para alcança-la.
     Disputa com Pyrro: debate teológico ocorrido na África para resolver questões dogmáticas e doutrinais e pelo qual S. Máximo convence Pyrro dos seus erros.
     Mystagogia: é uma análise simbólica dos ritos litúrgicos. De particular relevância os 07 primeiros capítulos onde o Confessor elabora uma ontología do misterio eclesial.
     De singular importância para nós, sua concepção de homem como microcosmos e a colocação de toda a criação à unidade.
     Comentário ao Salmo 59 trabalho exegético bíblico.
     Opúsculos teológicos e polêmicos onde destacamos o tema da Agonía de Jesus. Este tema é aprofundado por S. Máximo na defesa da plena humanidade de Cristo, sobre tudo para fazer a distinção entre as duas vontades de Cristo: a humana e a divina.
     Ao fazer-se homem Cristo apropiou-se de tudo o que pertence à natureza humana, compreendidos a dor e o medo à morte, mas conferindo-lhe aquilo que era seu como pessoa divina, cuja vontade humana era livre e independente, não escrava do pecado.
     Se Cristo teme a morte, como humano que era, com a mesma vontade humana supera o temor.

A Teologia da Divinização:

     No período monástico considerou a Divinização como o objetivo da vida cristã por ser esta “a plena realização da natureza humana em Deus”
     Trata-se de exigente fidelidade para conservar em nós a liberdade; em conformar o ser e sua vontade com a do Cristo, em qualquer situação, a fim de viver a intimidadeque Ele tinha com o Pai no âmago do mundo.
     Se a natureza, a vontade, a energia humanas de Cristo não forem respeitadas, então não haverá divinização real do homem, pois neste caso o caráter próprio do homem é aniquilado pelo poder divino.
     As grandes obras de S. Máximo situam-se neste contexto em que o cerne do debate é a união das duas naturezas, das duas vontades e das duas energias no Cristo, “sem confusão nem separação”
     “Só é salvo aquilo que tiver sido assumido”: se Cristo não é verdadeiramente homem, então, nós não fomos verdadeiramente salvos.
     Cristologia e Teologia da Divinização, segundo S. Máximo não estão separadas. Para ele, Jesus Cristo aparece como o homem plenamente universal, “católico” (segundo o todo), o homem da síntese, entre o criado e o incriado, entre o tempo e a eternidade, entre a liberdade humana e a liberdade divina: é o arquétipo do homem divinizado.

A Divinização como realização plena da natureza humana em Deus:

         S. Máximo considera a Divinização como a realização plena da quase natural, da natureza humana, voltada para seu fim que é Deus: para participar do Belo, da Verdade, do Bem, do próprio Ser. A liberdade humana consiste em aderir ao movimento íntimo de seu ser em direção ao Ser Eterno. Se não aderir a esse movimento, ele torna-se contranatural e entra na “região da dessemelhança” encontra-se em estado de hamartia (do grego: pecado, literalmente: “falhar ao alvo” . Não realiza seu propósito existencial. A Divinização é aquí, o repouso de todas as nossas faculdades na contemplação do Ser-Amor para o qual está encaminhado o nosso desejo. O homem não foi feito somente para produzir, ter, acumular, e sim é feito para Ser.

A Divinização como adoção pessoal do Pai no Filho Cristo:

         É concebida em um meio em que pode desabrochar a natureza, supostamente contemplativa do ser humano, encarada como o espaço em que se desenrola a aventura de nossa comunhão pessoal com Deus que confere a nosso agir uma feição inédita, de uma ascese prática. Trata-se da identificação com o Cristo, ao encarnar em cada um de nós, o Logos faz-nos filhos do Pai, a divinização é para S. Máximo adoção filial é o confessor da união das duas naturezas e das duas vontades no Cristo. A Divinização é exatamente a união de duas liberdades, de duas vontades: Não seja feita a minha vontade, mas a Tua vontade (Lc 22:42) Mas a vontade de Deus não toma o lugar da nossa; Deus não pensa por nós, nem deseja em vez de nós: a grandeza de Deus é que deixa subsistir a liberdade daqueles que se entregam a Ele. A Divinização é um processo que não ocorre de uma vez, mas cada dia trata-se de recomeçar a viver, na alegria como nas provações segundo o modo de ser de Cristo.

         O Pai Nosso como síntese e tratado de divinização segundo o Confessor:

      O Pai Nosso é uma breve síntese da filosofia dos primeiros séculos da era cristã, mas o verdadeiro filósofo é antes de tudo um homem de oração, ou seja, que vive em relação íntima com a Fonte de seu Ser.
      O Pai Nosso é uma theosis ou divinização progressiva descrita em etapas. Mostra a exigência de uma pedagogia na abertura ao Outro, ao Completamente Outro (Deus).
      A Escritura não deve ser verificada na sua referência semântica ou histórica, mas experimentada no movimento do Sopro (Pneuma) do espírito.

O que pedir?

      Pedi e vos será dado! Procurai e encontrareis! Batei e a porta será aberta! Todo aquele que pede, recebe, quem procura, encontra; quem bate, a porta será aberta (Mt 7: 7-8).
      Mas o que se deve pedir? Que merece ser procurado? Que porta bater? S. Paulo dizia que nós não sabemos pedir nem orar.
      Será necessário que o Espirito Santo interceda por nós para dizer Abba (Pai) Não será esse o objetivo da oração? harmonizar nossos desejos, nossas vontades, nossos pensamentos a fim de que se realize em nós a filiação divina?
      O Pai Nosso é tratado de divinização a obra do designio de Deus de deificarmos a nossa natureza.

“Pai Nosso que estás nos céus, santificado seja o teu Nome, venha a nós o Teu Reino

             Esta oração de Jesus nos conduz a contemplar uma revelação da Trindade: Somos chamados à ousar convocar a origem de todos os seres vivos, a causa primeira, o criador dos mundos.
      Ao nosso Pai pedimos-lhe que Seu Nome seja santificado, seu Nome é o próprio Filho; Em seguida pedimos-lhe que venha o Seu Reino: o Espírito Santo. Assim somos introduzidos no clima da vida trinitária e no desejo de “participar da natureza divina”
      Somos levados a honrar a Trindade consubstancial e superessencial como causa criadora de todas as coisas.

“Que seja feita a Tua vontade assim na terra como no céu”

      Nos primeiros versículos já pedimos a Deus, nosso Pai que nos conceda aquilo que Ele não pode deixar de nós dar, Seu Filho e Seu Espírito Santo: suas duas mãos pelas quais Ele nós recria incessantemente à sua imagem e semelhança com objetivo de elevar nossa vontade e nossa consciência até a companhia dos anjos.
             Semelhante espírito puro obtém- se por uma firme prática da lucidez e pelo adequado exercício da reta razão. Aprender a ver com clareza, a pensar com discernimento é o mais adequado meio de harmonizar nossa inteligência com a Inteligência criadora e assim realizar Sua vontade.

“O pão nosso suprasubstancial nós dai hoje”

           É necessário ter uma inteligência espiritual, uma razão esclarecida para compreender esta demanda, sob risco de interpretar esta no sentido grosseiro a demanda do pão. Não se trata do pão carnal, mas do pão dos anjos, do pão suprasubstancial (epoiusios)
     Alimento não do corpo destinado à morte, mas de um maná misterioso destinado à alimentar o divino em nós, o corpo que não morre, nosso corpo de gloria, segundo S. Paulo.
     Em relação à vossa alma, não vos preocupeis pelo que haveis de comer ou beber. Como pode ensinar a orar por coisas que não deveriam ser pedidas, segundo esta recomendação?
     O Salvador nos ordenou que procurássemos exclusivamente o Reino de Deus e sua justiça, é razoável que este Reino seja solicitado pela oração dos que desejam o Reino.
     O pão nosso de amanhã dai-nos hoje: é o pão do tempo da salvação, pão da vida. Hoje significa este mundo. Nosso pão que preparastes no começo para a imortalidade da natureza, da-no-lo hoje a nós que estamos mergulhados na vida presente.
     Para que a morte e o pecado sejam vencidos pelo alimento do pão da vida e do conhecimento.
     “Nossos pais no deserto comeram do maná e morreram. Quem comer deste pão e beber deste vinho viverá para sempre” ( Cântico de comunhão Liturgia Bizantina)

“Perdoa as nossas dívidas assim como nós perdoamos aos nossos devedores

     Alimentados pelo pão angélico e suprasubtancial, o coração transforma-se dotado de uma compreensão e discernimento angélicos.
     Torna-se capaz de compreender tudo, perdoa tudo. Conhecer-se a si mesmo, conhecer o que há no homem é tornar-se como o Cristo, capaz de dizer: Pai perdoa-lhes porque eles não sabem o que fazem.
     O perdão torna-nos semelhantes à Deus.

“Não nos deixes cair em tentação, mas livra-nos do maligno”

     Para S. Máximo somente aquele que tiver realmente perdoado poderá ser desembaraçado da tentação e da influência do maligno.
     O coração e o espírito impregnado do Amor não têm mais nada a recear.
     Para S. Máximo o maligno é o poder de ilusão que se apodera de nosso desejo e nos desvia do verdadeiro Real.
     Pede-se para Deus nos livrar especificamente do maligno pois este é a origem de todo mal, ainda que o mal seria algo muito vago e genérico.

Recapitulação da sua Contemplação:

      Remonta da última demanda à primeira, neste sentido se opera nossa divinização:
      Em primeiro lugar é necessário deixar de ceder à influência do maligno.
      Em seguida perdoar para que a graça do perdão de Deus se torne viva em nós.
      Assim sejamos alimentados com o pão dos anjos que é a contemplação da pura Bondade e participação de Sua Vida.
          Então é o Espírito de Deus que habita e reina em nós, o Filho encarna-se no mais profundo do nosso ser e por Ele podemos dizer a Deus Abba . Nosso Pai.