quinta-feira, 19 de dezembro de 2013

Santa Sametana (Samthann), abadessa de Clonbroney


     Sametana (ou Samthann) de Clonbroney não é tão conhecida hoje, embora a sua influência sobre o Cristianismo Celta tenha sido profundo. Sua legenda não a retrata como uma reformadora, mas simplesmente como mais uma pessoa santa na história da “Ilha dos santos”. No entanto, seu relacionamento espiritual com o jovem monge Maelruin levou-o a realizar a mais poderosa reforma da história do Cristianismo Celta. Sua vida está repleta de diferentes maravilhas: palavras de sabedoria, profecias, curas e milagres.
    Há três manuscritos em que a Vida de Santa Sametana é relatada, sendo a cópia mais completa um manuscrito do século XIV, em Oxford, na Bodleian Library, Rawlinson B. 485 ff.150-3, como parte do Codex Insulensis. Charles Plummer usou todos os três manuscritos nesta edição latina, que foi traduzida para o inglês por Dorothy Africa. Há pequenas variações entre os três manuscritos, não há omissões ou adições importantes, o que faz deles cópias confiáveis dos originais.
     Das quatro primeiras santas irlandesas que constam das Vidas latinas (Santas Brígida, Ita, Monena e Sametana), cronologicamente Sametana é a última, tendo os Anais de Ulster relatado sua morte em 19 de dezembro de 739. É também das primeiras menções a seu mosteiro em Clonbroney (Ir. Clúan-bróaig).
     Referências ao mosteiro continuaram a aparecer esporadicamente de meados do século VIII até o século IX, e depois muito raramente. O mosteiro, que deve ter sido fundado no século V, deixou de aparecer em relatos após a morte da Abadessa Caillechdomhnaill, em 1163.
     Samthann era uma donzela de Ulster, Irlanda, confiada por sua família à guarda do rei irlandês Cridan. Embora ela não quisesse se casar, o rei prometeu-a a um nobre. Na noite antes do casamento, o nobre, que se hospedara no castelo do rei Cridan, acordou com a visão de um faxo de luz que partia do telhado da residência real. Após ter subido para ver para onde a luz se dirigia, ele descobriu que ela descia em direção ao quarto de Sametana e banhava o seu rosto com uma luz celestial enquanto ela dormia. Este incidente milagroso, seguido de outro após o casamento, convenceu o nobre e o rei Cridan a atenderr ao desejo de Sametana de consagrar a sua virgindade a Deus. O rei lhe disse: "Nós te damos em casamento e te unimos a Deus, o cônjuge de tua escolha".
     Ao contrário das três santas monjas do século VI, Sametana não foi a fundadora do mosteiro, mas herdeira dele, após a então abadessa e fundadora Fuinnech ter uma visão profética da grandeza de Sametana. Isto fez com que Sametana fosse convidada a se mudar da Abadia de Urney (Ulster), onde ela foi monja e prioresa, para Clonbroney, que ficava a leste da moderna cidade de Longford.
     A Vida de São Patrício indica que Clonbroney foi fundado pelo Santo para duas irmãs de nome Emer, cujo irmão, Guasacht, foi feito bispo de Granard também por ele. Todos os três eram filhos de Milchú, a quem São Patrício em sua juventude servira como escravo em Ulster. Embora a história não pareça plausível, deve haver uma ligação entre Sametana e Granard, pois na sua Vida é relatado que ela viajou para lá. Sametana também tem origens em Ulster e as genealogias ligam-na de perto a São Patrício na Vida deste último.
     Muitos milagres foram atribuídos a ela. Quando um trabalhador contratado por ela para construir um oratório silenciosamente desejou para si e para os seus colaboradores uma festa de 40 pães com manteiga, queijo e leite, ele ficou aturdido ao ver esta refeição sonhada ser trazida a eles. Rindo de seu espanto, Sametana disse-lhe: "O desejo de seu coração está atendido, não é?"
     Quando um monge perguntou a ela em qual posição a oração deve ser feita, se deitado, sentado ou em pé, ela respondeu: "Em qualquer posição a pessoa deve orar!" Para alguém que falava de peregrinação, mas na realidade estava apenas ansioso para viajar e revestia isto com desculpas, ela disse: “Deus está perto de todos os que O invocam, e o Reino dos Céus pode ser alcançado de qualquer lugar".    Tudo quanto desta Santa se conta respira misericórdia e bondade.
     O Pe. José Leite, S.J., em seu livro Santos de Cada Dia, conta dois fatos interessantes sobre esta Santa.
     Um dia, na margem do ribeiro ao lado da abadia, [a Santa] encontra uma ermitã com um saco e neste um bebê que ela acabava de dar à luz e se dispunha a afogar, destruindo qualquer escândalo. “Deus seja louvado, minha Irmã”, diz Sametana, tomando-lhe conta do saco, “ora eu precisamente procurava um rapazinho para o educar!” E tão bem o educou que veio a ser um dos melhores abades que teve a Abadia de São Cainnech. Quanto à Irmã, mais feita para ser enclausurada do que ermitã, Sametana conservou-a algum tempo na abadia, animou-a, restabeleceu-a de todo, e depois mandou-a a santificar-se num convento onde homens só se viam através das grades da sala de visitas.
     Tendo ido o barco da abadia a Escócia buscar lã, foi apanhado no regresso por uma tempestade medonha. “Se nós não deitamos toda a carga da Velha ao mar, todos pereceremos sem exceção!”, exclamou o quartel-mestre. O mar logo amainou. Infelizmente, porém, a bonança, que veio a seguir, imobilizou o navio e os alimentos começaram a escassear. “Será que a Velha nos vai agora levar a morrermos de fome?”, exclamou de novo o quartel-mestre. Logo a seguir, levantou-se um pé de vento que pôs de novo a embarcação a caminho.
     Ao chegarem, os homens do navio foram beijar a mão da abadessa. “Está claro”, disse Sametana ao quartel-mestre, pondo-lhe a mão no ombro, “não é crime nenhum chamar-me ‘Velha’, mas dizer isto não bastava: era preciso rezar e vós estáveis todos perdidos se eu não tivesse rezado substituindo-vos”. Foi isto dito com tanta amabilidade que o marinheiro, enternecido até ao fundo do coração, não deixou desde esse momento nem um dia sem rezar alguma coisa.

Atual igreja paroquial de Clonbroney, Irlanda