Uma croata, duas eslovenas, uma austríaca e uma húngara foram elevadas à glória dos altares em 24 de setembro de 2011 como "mártires do Drina". Elas fazem parte da Congregação das Filhas do Amor Divina.
Num mundo em que a honra e a dignidade feminina são substituidas por uma liberdade que descamba para a libertinagem, essas cinco mártires da castidade, em pleno século XX, nos dão exemplo de qual é a verdadeira face da mulher católica.
A Serva de Deus Madre Francisca Lechner, Fundadora da Congregação das Filhas do Amor Divino, recebeu do Arcebispo Josef Stadler o convite para a abertura de uma Comunidade de Religiosas em Sarajevo, Bósnia. Após os trâmites legais, a própria Madre Francisca e duas Irmãs partiram de Viena, Áustria, no dia 24 de abril de 1882, e chegaram a Sarajevo no dia 28 do mesmo mês.
Em Sarajevo as Irmãs trabalhavam em escolas e acolhiam alunas internas e crianças órfãs. Rapidamente seu trabalho foi reconhecido e ganhou o prestígio da população. A missão das Filhas do Amor Divino foi se expandindo em Sarajevo e arredores, com o trabalho abnegado e generoso das Irmãs. Para atender a demanda da missão, foi necessário realizar novas fundações.
Assim, em 1911, em Pale, localidade distante cerca de 20 k de Sarajevo, abriram um convento, “Casa de Maria”. Inicialmente esta casa era destinada para o repouso das religiosas que trabalhavam no Instituto São José, em Sarajevo, e para a recuperação de doentes. Entretanto, a “Casa de Maria” foi recebendo credibilidade e se tornou famosa pelas obras de caridade exercidas em favor de todos os necessitados que batiam às suas portas. Pale era um corredor de muitos transeuntes, pessoas que iam e retornavam de Sarajevo. Nesta casa também eram acolhidas pessoas, sem fazer distinção de etnia, cultura, cor, religião, que vinham de diferentes lugares. Ali recebiam alimentação e, não raras vezes, lugar para um repouso restaurador de energias para então seguir a viagem.
As culturas ocidental e oriental - e seus respectivos interesses políticos e econômicos - chocavam-se seguidas vezes. A 2ª Guerra Mundial foi particularmente trágica na Bósnia oriental. O Rio Drina estabelece o limite entre as duas partes que hoje divide a Bósnia da Sérvia. Houve um conflito acirrado entre os sérvios e a população muçulmana e católica da Bósnia oriental. Estes povos foram duplamente provados pelas tragédias: em primeiro lugar, porque um grande número de civis inocentes perdeu a vida; em segundo, porque os que sobreviveram ao massacre tiveram de abandonar o seu ambiente e foram forçados a fugir.
Havia duas facções que entravam em atrito: os “četnik”, membros voluntários da tropa armada do Estado da Sérvia. É um grupo irregular com conotação terrorista contra os povos não Sérvios; os “uštasa”, croatas revolucionários da direita. Aqueles multiplicavam os ataques às populações civis católicas e muçulmanas. Os incêndios às vilas indefesas, as torturas mais desumanas e os assassinatos em massa, o corte das linhas de comunicação faziam parte da ordem do dia. Estes, apoiados pelas forças armadas de ocupação ítalo-germânica, instituíam, a exemplo destes, os campos de concentração onde perderam a vida dezenas de milhares de opositores ao regime, mas também civis inocentes.
Neste ambiente conflituoso, as Irmãs viviam e doavam a sua vida em favor do próximo e experimentavam a dor do povo indefeso e inocente.
As cinco Irmãs Filhas do Amor Divino que formavam a comunidade “Casa de Maria”, em Pale, eram:
- Maria Jula Ivanišević, croata, nascida em 1893, a Superiora. Ela entrou no convento aos 48 anos de idade, após o falecimento da mãe, que considerava essencial sua permanência na família e nunca deu permissão para ela se tornar freira. Era particularmente admirada pelas Irmãs por sua obediência e cuidado delas, fazia o serviço com cuidado, calma e paciência.
- Berchmana Leidenix, austríaca, nascida em 1865, de 76 anos, sofria de asma, via pouco e andava com dificuldade. Em sua juventude, dera aula, ensinara o catecismo, cuidara dos doentes e também fora mestra de noviças, "lutando por elas como uma leoa".
- Krizina Bojanc, eslovena, nascida em 1885, "silenciosa e diligente como uma abelha", entrou no convento com 36 anos, quando as condições da família o permitiram. Aos 56 anos de idade, ela tinha um olhar atento para ajudar e confortar suas coirmãs, porque ela era simples, mas "cheia de Deus, era como se estivesse sempre pensando em Deus".
- Atonija Fabjan, eslovena, nascida em 1907, de 34 anos, para alguns era 'um tanto séria demais', mas para todos era a irmã que nunca "tem que pedir um favor, porque ela vê primeiro as nossas necessidades e está imediatamente pronta para ajudar".
- Bernadeta Banja de origem húngara, nascida na Croácia em 1912, de 29 anos, era a cozinheira da comunidade, mas tão pequena de estatura que tinha que subir em um banquinho para desempenhar sua função. Era de uma família devota e numerosa, que considerou sua vocação como uma bênção de Deus; alegre, ela escolheu ser "fiel no pouco", e fazia um grande trabalho sobre si mesma para melhorar seu caráter e ser mais prestativa e humilde.
O ódio obscurece corações e consciências, e sem razão golpeia a dignidade humana, a dignidade da mulher, da religiosa. Por isso, era perigoso viver em Pale. Diante das sugestões de abandonar o povo, as Irmãs que ali viviam decidiram permanecer no meio dele, para compartilhar sua sorte e continuar a testemunhar-lhes o Amor Divino. Como era de se esperar, em 11 de dezembro de 1941, os soldados da milícia “četnik” aprisionaram as Irmãs, saquearam e incendiaram o convento.
Assim iniciou a via-sacra dessas cinco Irmãs. Elas foram obrigadas a marchar, durante 4 dias e 4 noites, pelos caminhos da montanha Romanija, com frio e na neve, sem veste adequada, com interrogatórios, ameaças e ofensas. Irmã Berchmana, com 76 anos, não podendo prosseguir a caminhada, foi levada a Sjetlina, onde se recuperaria do cansaço. Conforme o combinado, ela deveria ser levada também para Goražde, a fim de se juntar ao grupo de suas coirmãs, o que não aconteceu. Consta que ela foi morta no dia 23 de dezembro, no bosque de Sjetlina.
As demais Irmãs tiveram de continuar a sua caminhada até Goražde, percorrendo cerca de 70 km. Ali chegaram na tarde de 15 de dezembro e foram levadas à caserna (2° andar do quartel), próxima ao rio Drina. À noite, os “četnik”, completamente embriagados, invadiram o seu quarto com intenção de violentá-las, pediram que renunciassem à vida religiosa. Em troca, suas vidas seriam garantidas, teriam trabalho e graduação militar. Elas, porém, resistiram fortemente e declararam que estavam prontas a morrer antes de trair Deus e a própria consagração.
Em defesa da dignidade e honrando o voto de castidade, Irmã Jula, Superiora da Comunidade, para evitar o estupro, abriu a janela e convidou as demais Irmãs a segui-la. Com a invocação “Jesus, salva-nos!”, lançou-se no vazio e as outras três fizeram o mesmo. Os soldados furiosos, sentindo-se derrotados, às pressas desceram as escadas até o local onde as Irmãs haviam caído e com muitíssimos golpes de faca mataram-nas. Depois, chutaram seus corpos até as margens do rio Drina. Um soldado, também ferido por este grupo, viu como cada uma delas, antes de morrer, fez o sinal da cruz.
As Irmãs Jula, Berchmana, Krizina, Antonija e Bernadeta, conhecidas como as Mártires do Drina, verdadeiras missionárias na Bósnia sofrida, serviram a Deus e aos pobres com generosidade e amor desinteressado. Ao derramarem seu sangue, confirmaram a fidelidade a Deus. As cinco Mártires são extraordinários modelos de fé a Deus e de verdadeiro amor aos necessitados. O ato heróico dessas Filhas do Amor Divino teve o reconhecimento oficial da Igreja. O sangue derramado seja semente de novos cristãos comprometidos e de novas vocações. Que elas intercedam a Deus pelas nossas necessidades.